Estamos em uma fase de reformulação: de sistema, de remuneração, de formação, de pensamento clínico”, afirmou Lívia Callegari, advogada e membro da Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), na abertura do ciclo de conferências sobre autonomia do médico – realizada em 5 de setembro, segundo dia do IX Congresso Brasileiro de Direito Médico, organizado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). O segmento contou com a coordenação de Jeancarlo Cavalcanti, conselheiro federal pelo Rio Grande do Norte, que destacou a relevância de todas as exposições.

Na visão da advogada, “o paciente é cada vez mais do hospital e não mais do médico”. Para chegar a essa conclusão, ela leva em conta fatores como divisão técnica de trabalho, assalariamento, carga horária, número de atendimentos, limitação à quantidade de exames e procedimentos, protocolos, monitoramento de indicadores, controle do acesso e do fluxo de pacientes.

Abordando os conflitos de interesse existentes na assistência à saúde, Lívia Callegari pontuou que “não é difícil encontrar protocolos que priorizam metas para economia do sistema. E os médicos deveriam participar da elaboração de guias, protocolos e padronizações sabendo que foram elaborados a partir de evidências com bases estruturadas para se pesar riscos, benefícios e custos aos pacientes. Mas, infelizmente o processo de criação desses documentos nem sempre segue essa lógica”.

Autonomia – O advogado Osvaldo Simonelli, que atua no Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), ponderou que, ao se tratar de autonomia médica, é preciso considerar também a autonomia do paciente. Citando o artigo 5º da Constituição Federal, questionou: “será que somos, de fato, autônomos nos sistemas atuais? Precisamos entender que a autonomia é definida a partir de normas e, assim, delimitada – o que é bom “.

Para o palestrante, o maior dos marcos de autonomia médica está no Código de Ética Médica – ao afirmar que “o médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente”.

Escolha – Dando continuidade aos debates sobre autonomia, o defensor público-geral federal Gabriel Faria Oliveira defendeu que, “ao paciente – independentemente do perfil socioeconômico – devem ser garantidas as condições para escolha autônoma, esteja ele na rede pública ou privada. E o médico tem grande responsabilidade com a garantia da igualdade e da equidade nesse processo”.

O chefe da Defensoria Pública da União (DPU) destacou também que a autonomia médica tem grande relevância e impacto no Judiciário – apontando que, ” apesar de hoje estarmos também tabelados, seguimos a indicação médica e vamos em busca dos procedimentos e medicamentos. Tanto que um dos aspectos que mais gera judicialização no campo da saúde refere-se ao descompasso entre o que é oferecido na rede pública e o que é prescrito pelo médico”.

Marcos de reconhecimento tanto da autonomia médica quanto do paciente, os conferencistas destacaram ainda a relevância do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e de avocação de objeção de consciência. Nesse sentido, o juiz de Direito João Costa Neto, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, alertou que “a grande questão na objeção de consciência é definir o que é matéria de ordem pública e o que é de ordem privada, o que é um acordo moral razoável”.

Fonte: Conselho Federal de Medicina