A Sociedade Brasileira de Direito Ético e Bioética (Anadem) alerta para a necessidade urgente de um alinhamento técnico quanto aos procedimentos que, segundo relatos divulgados pela imprensa, vêm sendo adotados por socorristas em Manaus e que podem ser classificados como mistanásia, modalidade de término de vida em que um paciente vulnerável é acometido de uma morte precoce e evitável como consequência da violação de seu direito à saúde.

A entidade emitiu parecer sobre o tema após ser consultada pelo Sindicato dos Médicos do Estado do Amazonas (SIMEAM) quanto à conduta descrita por uma médica de Manaus em reportagem do programa Fantástico. Na matéria, ela relata que a morfina é ministrada em bombas de infusão às vítimas de Covid-19, “racionando o oxigênio a tais pacientes até entrar em coma e falecer, ter uma parada cardiorrespiratória”.

Questionada se a conduta pode ser considerada eutanásia, a Anadem manifestou seu entendimento de que “caso esteja realmente sendo adotado na cidade de Manaus o protocolo descrito pela médica, ele pode ser classificado como mistanásia”. Por esse motivo, recomenda, com urgência, “o alinhamento técnico científico quanto às divergências de interpretação por profissionais da área médica sobre as modalidades relacionadas à terminalidade da vida”.

Para Raul Canal, presidente da entidade, “o caos que se instalou em Manaus, e no Estado do Amazonas como um todo, com mais de 40% de pacientes na fila de espera para internação, tem exposto os profissionais de saúde, o elo mais fraco e vulnerável dessa corrente, deixando-os à mercê dessas condutas atípicas do ponto de vista médico, mas praticamente tipificadas no âmbito penal”

O especialista em direito médico e bioética avalia ainda que “os debates e discussões sobre o tema são complexos e controversos, uma vez que envolvem inúmeros fatores decorrentes da evolução tecnológica na medicina, dos modelos de governança no sistema de saúde, da tendência cada vez maior de novos hábitos de consumo de medicamentos e da busca pela qualidade de vida sem dores, além da relação entre religião, espiritualidade e sentido da vida”.

SAMU

O depoimento da médica, ainda de acordo com as observações da entidade, leva a crer que a conduta descrita seja o procedimento operacional padrão adotado pelos profissionais e não algo derivado ou deliberado. Dessa forma, não se configura um agir voluntário, enquanto conduta médica livre e autônoma, mas sim em obediência a um protocolo padrão instituído pelas autoridades competentes.

“O papel do SAMU, ao qual pertence a doutora, é prover o traslado de urgência. Buscar o paciente e conduzi-lo com segurança e cuidados emergenciais até uma unidade hospitalar onde o mesmo deva ser internado e tratado. Chegando à unidade, caso não haja vagas, o SAMU não pode responsabilizar-se pela custódia do doente, mesmo porque suas unidades não estão equipadas e suas equipes não estão preparadas para tal”, acrescenta.

Fonte: Medicina S/A