O blog Sonho Seguro foi conversar com Solange Beatriz Palheiro Mendes, presidente da Federação Nacional da Saúde Suplementar (FenaSaúde) para entender como uma tendência de empresas criarem seus próprios planos de saúde pode afetar o setor. A questão em foco foi a união do megainvestidor Warren Buffett, presidente da Berkshire Hathaway; Jeff Bezos, presidente da Amazon; e Jamie Dimon, diretor-executivo do JPMorgan Chase, sobre criarem uma seguradora de saúde, anunciada em janeiro deste ano. Veja abaixo os principais trechos da entrevista:

Como vê essa notícia? É um risco para as operadoras?

Não nos causa surpresa. Nos Estados Unidos e em outros países, assim como no Brasil, o desafio é semelhante: a evolução das despesas com saúde não acompanha a capacidade de pagamento da população. Há tempos estamos alertando para os riscos à sustentabilidade desse sistema, que tem preocupado todos que atuam no setor em razão da acelerada evolução dos custos da saúde. A variação desses gastos vem aumentando acentuadamente nos últimos anos, quando comparada com os índices de inflação. Entre 2008 e 2016, o IPCA variou 65,2% contra custos na ordem de 142,8% – medido pelas despesas assistenciais per capita médico-hospitalares. Nesse período, o reajuste autorizado pela ANS foi de 104,2%. Essa conta não fecha e as empresas contratantes de planos de saúde já estão percebendo isso, uma vez que, na maioria delas, o plano de saúde de seus funcionários representa a segunda maior despesa com pessoal, perdendo apenas para a folha de pagamento.

Acha que a saída para as operadoras passa a ser o seguro individual?

A saída passa pela mudança no modelo de remuneração de prestadores de serviços e no modelo de assistência à saúde. O fee for service estimula a superutilização dos recursos de saúde, uma vez que remunera de acordo com o volume de procedimentos prescritos.

Pode citar exemplos?

Há movimentos de operadoras e até de alguns hospitais para modelos mais sustentáveis que compartilhem o risco de forma mais equilibrada. Um exemplo é o DRG – Diagnosis Related Group. É uma metodologia mais sofisticada para o gerenciamento do uso de materiais e da qualidade assistencial, que permite a elaboração de pacotes – clínicos e cirúrgicos – para a comercialização de serviços hospitalares, com base nas informações coletadas a partir da internação. Essa também é uma forma de comparar a eficiência entre equipes diferentes de profissionais e prestadores.

Em que estágio está tal mudança?

A mudança de modelo de remuneração dos profissionais de saúde no Brasil está em andamento e há iniciativas em buscar novos formatos, que se adequem a realidade e peculiaridades brasileiras. A solução não passa pela incorporação de um modelo pronto. Também é necessário pensar em mudanças no modelo assistencial, com o cuidado voltado à saúde e não à doença. Adotar critérios de custo-efetividade para as incorporações tecnológicas também é uma das saídas para controlar o crescimento desses custos. Para tanto, é preciso união em uma só direção de todas as pontas da cadeia de Saúde Suplementar.

Você acredita que essa tendência já chegou ao Brasil com os planos auto administrados, como os das montadoras?

Sim, já se observam iniciativas no sentido de instalar ou aprimorar a gestão da saúde dos colaboradores. Mas, é preciso ressaltar que ainda não há expertise nos RHs da maioria das empresas para conduzir a gestão da saúde de seus empregados. Nesse caso, a integração entre empresas, operadoras de planos de saúde e hospitais pode ser a melhor saída.

Tem números sobre os planos auto administrados, como quanto eles representam do faturamento total do setor?

De acordo com dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), são 161 operadoras de autogestão, com 4,8 milhões de beneficiários, que até setembro de 2017 movimentaram uma receita de R$ 15,6 bilhões e despesas na ordem de R$ 14,7 bilhões.

Acha que isso vai acelerar as discussões no Brasil sobre se ter um mercado mais amigável para todos os envolvidos na cadeia da saúde suplementar?

Sim. Toda a cadeia produtiva sabe que é preciso mudar os modelos de acesso e de financiamento, mas falta um maior entendimento. É uma discussão urgente, porque os gastos estão ficando impagáveis. E se mais pessoas deixarem a Saúde Suplementar, os custos para os que ficarem serão ainda mais altos.

A aposta é na tecnologia para reduzir custos. Tanto cruzar infos para evitar fraude como apps voltados para alertar consumidores sobre desperdício, remédios e que ajudem a melhorar a qualidade de vida do clientes. Concorda? Se sim, pode comentar sobre tendências em uso no Brasil?

Sim, mas, por outro lado, o ritmo acelerado de desenvolvimento de novas tecnologia representa, ao mesmo tempo, a tendência e o maior desafio para a Saúde Suplementar nos próximos anos. Pode soar paradoxal, mas cabe explicação. Entre as principais tendências de mercado, o desenvolvimento de novas tecnologias possibilita avanços na medicina que prolongam com qualidade e bem-estar a vida das pessoas. Esse é um caminho sem volta na área da saúde e muito bem-vindo. Na outra ponta, a tecnologia permite, ainda, melhorar a comunicação entre consumidores e operadoras. Entretanto, a indústria impõe um ritmo avançado de incorporação de tecnologias, o que cria desafios econômicos para o setor de saúde. Um dos principais é equilibrar os custos assistenciais, historicamente, mais elevados – potencializados pela adoção de novas tecnologias, procedimentos – do que as receitas das empresas. Em dez anos, o resultado operacional do setor fechou em vermelho em seis, sendo o último analisado o de 2016.

Fonte: Sonho Seguro MetLife