Um levantamento feito pela SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria) aponta que, nos últimos seis anos, a capital perdeu 1 em cada 4 leitos pediátricos públicos e privados. Foram 650 vagas a menos para internação de crianças (a queda foi de 2.733 para 2.083, ou 24%).

As redes pública e privada contribuíram proporcionalmente para a queda. Em 2010, o SUS oferecia 1.554 vagas, contra 1.176 no ano passado. Na rede privada, a queda foi de 1.1179 para 907. O fenômeno é semelhante no Estado, onde 1 em cada 5 vagas foram extintas. O número de leitos infantis caiu de 9.307 para 7.512.

Mais uma vez, a queda foi parecida tanto em relação aos leitos do SUS (de 6.041 para 4.832, redução de 20%) quanto da rede privada (de 3.266 para 2.680, queda de 18%).

O vice-presidente da SBP, Clóvis Francisco Constantino, afirma que a redução de vagas está ligada ao sucateamento da estrutura física dos hospitais e à falta de vontade política. “Foram relatos de pediatras de vários locais do país que nos levaram a fazer o levantamento. O fechamento de leitos acarreta na deficiência da qualidade da assistência à saúde”, disse.

Constantino afirma que, para hospitais particulares, manter um leito infantil é pouco rentável. “Os leitos relacionados a cirurgias e especialidades que usam tecnologia em larga escala e drogas muito caras são muito mais lucrativos. Um hospital prefere ter um leito para um paciente com câncer a um para uma criança”, afirmou.

Com a redução, são cada vez mais constantes casos de crianças que ficam até dias em macas aguardando transferência e, consequentemente, com risco de agravamento de doenças. “Os leitos, que já eram poucos, estão mais reduzidos. A criança que necessita de hospitalização vai ficar aguardando em uma fila de transferência até surgir uma vaga”, completou Constantino.

FILA

Stella tem três meses de idade e já sentiu na pele o que é depender do sistema público de saúde: à espera de internação, dormiu três noites no pronto-socorro do Hospital Infantil Cândido Fontoura, sob a gestão Geraldo Alckmin (PSDB).

A saga de Stella, que mora com os pais em Itaquera (zona leste), começou na sexta-feira da semana passada, quando teve febre e dificuldade para respirar, conta a mãe da bebê, a dona de casa Natália Mariano Silva, 21. Stella e seus pais chegaram ao hospital à tarde. A mãe conta que, após consulta, a bebê fez exames de raio-X e de sangue –mas o resultado demorou. “Tivemos que esperar o resultado até a manhã seguinte”, diz Natália.

O diagnóstico: bronquiolite e broncopneumonia. Após pedido de internação, os pais foram avisados de que todos os leitos estavam ocupados e não havia previsão de liberação. Se saísse do hospital, Stella perderia a chance de conseguir uma vaga, diz a mãe dela.

Por mais duas noites, os pais da bebê se revezaram, um dormindo no carro e outro na cadeira do pronto-socorro, ao lado de Stella, em um berço pequeno do hospital –que deu alimentação e banho para uma pessoa.

“É constrangedor passar por uma situação dessas, minha filha chorando o tempo todo e eu sem poder amenizar seu desconforto”, diz Natália. Stella foi internada na segunda-feira à tarde e teve alta ontem, por volta das 20h.

CRIAÇÃO DE VAGAS

A Secretaria Municipal da Saúde da gestão João Doria (PSDB) disse que, devido à redução do número de leitos pediátricos dos últimos anos, já trabalha na implantação de novos leitos ainda em 2017. A pasta disse já ter programada a implantação de novas 117 vagas de internação, das quais 38 são de UTI neonatal e pediátrica, nos hospitais Brasilândia (zona norte) e Parelheiros (zona sul) –que estão em obras.

A gestão Fernando Haddad (PT) diz que não houve fechamento de leitos em seu governo, só mudança de pediátricos para outras especialidades.

A Secretaria Estadual da Saúde do governo Geraldo Alckmin (PSDB) disse que a redução de leitos pediátricos clínicos se concentrou principalmente entre os hospitais filantrópicos, como as Santas Casas. O texto afirma que nove hospitais no Estado estão em construção e mais 20 leitos de UTI pediátrica e 10 leitos de UTI neonatal serão abertos.

A Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde) disse não ter conhecimento específico da queda do número de leitos. Segundo a nota, entre 2011 e 2015, houve aumento de 18% no número de internações a cada 1.000 beneficiários.

O Hospital Infantil Cândido Fontoura, sob gestão Geraldo Alckmin (PSDB), afirmou que Stella foi devidamente assistida. Segundo a unidade, a demora na liberação do leito ocorreu pela necessidade de priorizar casos urgentes. Afirmou, ainda, que todos os pacientes são atendidos.