“As instituições de saúde não podem ser penalizadas com legislações ou ações que as inviabilizem”. A afirmação é da senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS), que será uma das palestrantes do painel “O impacto das Reformas Políticas na Saúde”, durante o 27º Congresso da CMB. De acordo com a parlamentar, as Santas Casas e hospitais sem fins lucrativos respondem pela maioria dos atendimentos pelo SUS no Brasil e, por isso, precisam de estímulo e apoio. “Vejo como obrigação do gestor público de saúde ter a exata noção da relevância do trabalho das Santas Casas e dos hospitais filantrópicos. Acredito também que o país precisa definir políticas públicas de longo prazo, elaboradas com a participação direta de quem vivencia o dia a dia da saúde”, afirmou, em entrevista à CMB.

Segundo Ana Amélia, há uma cobrança frequente em relação ao déficit da Tabela SUS, mas ela acredita que o financiamento precisa ser feito de maneira correta, respondendo a uma gestão eficiente do recurso público. “Também é preciso transparência e fiscalização rigorosa dos investimentos para que não haja desvios ou fraudes que façam o dinheiro escorrer pelo ralo da corrupção”, alegou.

A senadora declarou ainda seu apoio ao PL 7606/2017, que aguarda para entrar na pauta do Plenário da Câmara, como uma matéria importante para a manutenção dos hospitais que irão se beneficiar do Programa de Financiamento específico para santas casas e hospitais sem fins lucrativos que atuam no SUS (Pró-Santas Casas).

Confira a íntegra da entrevista e não perca a palestra da senadora Ana Amélia, que dividirá a mesa com o deputado Jorge Solla (PT-BA), no dia 15 de agosto, às 17h.

 

CMB – Qual o papel do Legislativo para manter a agenda política e combater a excessiva judicialização e seus impactos negativos?

Sen. Ana Amélia – O número de ações judiciais cresce a cada ano no âmbito federal e, também, nos Estados e municípios. Em São Paulo, por exemplo, o número de condenações praticamente duplicou entre 2010 e 2015, passando de 9,3 para 18 mil. Especialistas apontam que as dificuldades do sistema público em oferecer bons serviços, acrescidos ao envelhecimento da população, à crise econômica e aos cortes no orçamento da saúde, também contribuíram para esse aumento da judicialização. Nesse sentido, os debates sobre esse tema têm se avolumado nos últimos anos. Nós, legisladores, precisamos perceber os efeitos graves dessa judicialização e buscar soluções, em parceria com todos os protagonistas: médicos, especialistas, gestores e entidades. Dessa união precisam resultar regras claras que ofereçam segurança jurídica e o acesso amplo da população a um sistema de saúde mais eficiente. Um exemplo é o projeto de lei (PLS 17/2015) que apresentei no Senado definindo regras mais rígidas no mercado de órteses e próteses, fruto de escândalo recente, para combater as fraudes e garantir punição dos envolvidos. A iniciativa também visa maior clareza em relação às informações sobre preços, detalhamento de procedimentos, ferramentas de controle e outras ações para que o setor tenha clareza do que é certo ou errado.

CMB – O que o Legislativo tem feito para se garantir a efetiva e justa remuneração dos serviços prestados ao SUS, principal fator de endividamento dos hospitais sem fins lucrativos, consequentemente, impactando na redução e na qualificação da assistência à Saúde?

Sen. Ana Amélia – Tenho cobrado, com frequência, sobre a grave defasagem no reajuste na tabela do SUS, em audiências nas comissões do Senado, nos ministérios e também em sessões temáticas com a presença de ministros da Saúde no Plenário do Senado. Também promovi, na Comissão de Assuntos Sociais do Senado, uma audiência pública com a presença de representantes do setor, que nos apresentaram os dados sobre os efeitos danosos dessa defasagem, na contabilidade das instituições.  Essa correção não ocorre há mais de 20 anos e isso é um dos fatores mais graves de endividamento dessas instituições, responsáveis por mais de 50% dos atendimentos pelo SUS no Brasil e única opção de atendimento gratuito em mais de mil municípios. No meu Estado, o Rio Grande do Sul, por exemplo, as Santas Casas e os hospitais filantrópicos realizam 70% dos atendimentos pelo SUS. Esse dado reforça a importância dessas instituições. Numa das sessões, com a presença do então ministro da Saúde Alexandre Padilha, ainda em 2013, ao questioná-lo sobre a necessidade do reajuste, o ministro disse que “precisamos fazer escolhas. Entre escolher financiar exame e escolher financiar internação que resolva o problema da população, entre financiar uma glicemia e financiar o cuidado, a equipe que vai cuidar do diabético e colocar o remédio para diabetes de graça, nós optamos por financiar mais a assistência farmacêutica e o cuidado integral”. É uma situação grave que tem obrigado muitas instituições a fechar as portas.

CMB – Diante da limitação imposta pela EC 95 para utilização de recursos da União, quais ajustes podem ser feitos no orçamento, a fim de se garantir a continuidade nos investimentos necessários à manutenção dos serviços públicos de saúde?

Sen. Ana Amélia – Um dos caminhos essenciais para garantir que o investimento seja feito da maneira correta é ter uma gestão mais eficiente do recurso público. Também é preciso transparência e fiscalização rigorosa dos investimentos para que não haja desvios ou fraudes que façam o dinheiro escorrer pelo ralo da corrupção. A PEC do Teto dos Gastos exige um equivalente a 15% da receita corrente líquida para saúde. Hoje, os municípios são os que menos recebem em relação ao que é arrecadado em impostos (15%), mas a maioria deles investe mais de 20% em saúde. O governo federal, que fica com 60%, quatro vezes mais do que vai para os municípios, precisa dar o exemplo e aplicar recursos mínimos exigidos.

CMB – Diante da grave crise política vivenciada pelo País nos últimos anos, que ocasiona uma alta rotatividade nos cargos de gestão pública, impedindo a formação de um legado técnico e políticas públicas adequadas e exequíveis, como garantir o futuro das instituições de saúde?

Sen. Ana Amélia – As instituições de saúde não podem ser penalizadas com legislações ou ações que as inviabilizem. Como afirmei na resposta anterior, respondem pela maioria dos atendimentos pelo SUS no Brasil. Precisam de estímulo e apoio e não de novas dificuldades.  Vejo como obrigação do gestor público de saúde ter a exata noção da relevância do trabalho das Santas Casas e dos hospitais filantrópicos. Acredito também que o país precisa definir políticas públicas de longo prazo, elaboradas com a participação direta de quem vivencia o dia a dia da saúde. Uma das iniciativas que defendo, já aprovada pelo Senado, e que precisa avançar logo na Câmara, é o projeto que autoriza bancos públicos a concederem empréstimos subsidiados para santas casas de misericórdia e outras instituições filantrópicas (PL 7606/2017). A proposta permite à União subsidiar, com dinheiro do Orçamento, até R$ 2 bilhões por ano. Já tratei desse tema diretamente com o presidente Michel Temer, com o novo presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, e com o presidente da Caixa Econômica Federal, Gilberto Occhi. Outra ação importante é cobrar do governo a liberação das emendas para essas instituições, que servem como uma fonte de recursos importante para melhorar o atendimento. É preciso que as instituições, igualmente, ofereçam sempre, à sociedade, transparência nas contas.

Fonte: CMB