Há nove dias à frente do ministério da Saúde, o médico cardiologista Marcelo Queiroga surpreendeu diversos deputados nesta quarta-feira (31) ao afirmar que medidas sanitárias, como o isolamento social e o uso de máscaras, devem ser adotadas imediatamente pela população brasileira a fim de frear o aumento exponencial da curva de transmissão da Covid-19 no País.

“Precisamos baixar a curva [de contágio] e aí são as medidas sanitárias, para que medidas mais extremas, como esses fechamentos mais intensos, conhecidos em inglês como ‘lockdown’, não ocorram, até porque a população sabidamente não adere ao ‘lockdown’”, disse ele, conclamando os brasileiros a não promoverem festas ou reuniões no feriado da Semana Santa. “Não há o que comemorar com a nossa sociedade tão fragilizada.”

O novo ministro ressaltou que terá autonomia no comando da pasta e prometeu uma atuação mais próxima da comunidade científica, das secretarias estaduais e municipais de saúde e da imprensa. “Para que todos possamos falar a mesma língua e levar uma mensagem uniforme para a sociedade”, destacou.

Primeiro vice-presidente da Câmara, o deputado Marcelo Ramos (PL-AM) disse que o novo ministro renova as esperanças do povo brasileiro por uma condução mais coordenada com a Organização Mundial da Saude (OMS) e com a ciência médica, mas fez um apelo para que Queiroga explique ao presidente Jair Bolsonaro que “isolamento social não é pra resolver o problema da pandemia e sim para evitar o colapso do sistema de saúde”.

“O presidente Bolsonaro acabou de dar uma declaração dizendo que o isolamento não resolve o problema”, disse Ramos, referindo-se a fala do presidente da República logo após a primeira reunião do comitê formado por governo e Congresso para discutir ações na pandemia. “Nenhuma nação se sustenta por muito tempo com esse tipo de política [de isolamento social]”, disse Bolsonaro, após a reunião da qual participaram Queiroga e os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco.

Quarto ministro a assumir a pasta desde o início da pandemia, Queiroga foi ouvido em reunião conjunta das comissões de Seguridade Social e Família; e de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Ele substitui o general Eduardo Pazuello.

A audiência foi sugerida pelos deputados Flávia Morais (PDT-GO), Adriana Ventura (Novo-SP), Vivi Reis (Psol-PA), Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Bira do Pindaré (PSB-MA) para debater as ações do governo federal no combate à Covid-19.

Vacinas
Queiroga reiterou o compromisso da posse de vacinar 1 milhão de pessoas por dia no mês de abril, e respondeu a diversas perguntas de deputados sobre a habilitação de mais leitos para pacientes com Covid-19 e sobre o novo posicionamento do ministério em relação ao isolamento social e ao chamado Kit Covid, que inclui medicamentos como cloroquina, ivermectina e azitromicina, considerados, pela ciência, ineficazes no enfrentamento do coronavirus.

Os deputados Carlos Veras (PT-PE), presidente da Comissão Direitos Humanos e Minorias; Adriana Ventura (Novo-SP), Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e Marx Beltrão (PSD-AL) questionaram o ministro sobre o cronograma de aplicação de vacinas. “Sabemos que hoje 38% dos pacientes em UTI têm menos de 44 anos, em função da nova variante P1. Não nos contentamos em dizer que temos 500 milhões de doses, porque precisamos vacinar os jovens até junho e julho, senão teremos uma terceira onda no País”, alertou Feghali.

Segundo Queiroga, o governo já contratou 562 milhões de doses de vacinas, que são entregues conforme um cronograma pré-estabelecido. “Estamos buscando formas de antecipar a entrega das 130 milhões de vacinas da Pfizer, que têm entrega prevista para o segundo semestre, para que possamos ampliar a velocidade da vacinação”, disse.

Até o momento, segundo ele, os estados já receberam cerca de 35 milhões de doses, das quais 18 milhões já foram aplicadas. “Até sábado, nós vamos entregar mais 11 milhões de doses”, disse Queiroga, que espera cumprir a meta de 1 milhão de doses aplicadas por dia em abril.

Tratamento precoce
Diversos deputados indagaram incisivamente o ministro sobre qual será a orientação do Ministério da Saúde em relação ao tratamento precoce com o chamado “Kit Covid”. De acordo com o ministro, o governo estuda um novo protocolo assistencial para a Covid-19, em parceria com o Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos e sociedades científicas.

“Vamos deixar que médicos, pesquisadores e autoridades sanitárias definam um protocolo claro. Esse protocolo será colocados para os médicos”. Queiroga ressaltou, no entanto, que o protocolo não impedirá os médicos de receitarem medicamentos off-label (com indicação divergente na bula). “Muitos outros medicamentos são prescritos mesmo sem a indicação na bula. Os médicos tem que ter autonomia para exercer a medicina, isso vem de Hipócrates [grego considerado o pai da medicina]”, concluiu.

Leitos de UTI
O ministro também respondeu a questionamentos sobre o o esforço do governo para a habilitação de leitos e para a a reativação de hospitais de campanha. Segundo o último boletim do Observatório Covid-19 da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), as internações por Covid-19 já comprometem boa parte dos recursos hospitalares em diversos estados e municípios do País, incluindo equipamentos, medicamentos, insumos e profissionais de saúde. No dia 22 de março, a taxa de ocupação de leitos de UTI destinados a pacientes com a doença estava acima de 80% em 24 estados e no Distrito Federal – em 17 deles e no DF superava 90%.

Queiroga informou que o ministério já acionou a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), demonstrando o interesse de compra de testes rápidos de Covid-19 e de insumos médicos, como o kit intubação. “É para restabelecer os estoques e não ficar enxugando gelo”, disse. Em relação a leitos, disse que, em março, foram habilitados 14.746 novos leitos para Covid no País e que novas habilitações dependem da demanda dos gestores estaduais e municipais de saúde.

Mesmo assim, o ministro, voltou a falar em uso de uso de máscaras e em distanciamento social ao argumentar que, mesmo se o número de leitos disponíveis for duplicado, ainda assim haverá falta de recursos humanos. “Um leito não é só uma cama e um respirador. Precisamos de médicos e enfermeiros qualificados”, disse. A pasta estuda, segundo ele, a criação de um programa educacional para qualificar médicos intensivistas e a abertura de mais vagas de residência médica em áreas estratégicas.

Fonte: Agência Câmara de Notícias