Atendendo à solicitação de assessores de comunicação de alguns hospitais afiliados, a assessoria jurídica da FEMIPA esclarece que, ressalvadas as hipóteses de obrigação legal ou contratual (notificação compulsória, requerimento pelas autoridades competentes e troca de informações com operadoras de planos de saúde, por exemplo), dados sobre o tratamento dos pacientes devem ser divulgados de maneira cautelosa, mesmo durante a atual pandemia.

É que os dados relacionados à saúde estão diretamente relacionados à privacidade e à dignidade da pessoa humana, então o sigilo é um dos principais direitos do paciente e deve ser respeitado em todas as esferas de atendimento, independentemente da prestação de serviços em caráter particular ou gratuito.

O Código de Ética Médica (Resolução CFM nº 2.217/2018) trata do sigilo médico em seu Capítulo IX, ressaltando que regra também se aplica aos fatos de “conhecimento público”, como se pode observar no art. 73:

Capítulo IX

SIGILO PROFISSIONAL

É vedado ao médico:

Art. 73.Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.

Parágrafo único. Permanece essa proibição: a) mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido; b) quando de seu depoimento como testemunha (nessa hipótese, o médico comparecerá perante a autoridade e declarará seu impedimento); c) na investigação de suspeita de crime, o médico estará impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo penal.

E o mesmo entendimento foi consolidado pelo Conselho Federal de Enfermagem, por exemplo, que, no art. 52 da Resolução COFEN nº 564/2017, reforça o dever de sigilo atribuído aos profissionais de enfermagem:

Art. 52 Manter sigilo sobre fato de que tenha conhecimento em razão da atividade profissional, exceto nos casos previstos na legislação ou por determinação judicial, ou com o consentimento escrito da pessoa envolvida ou de seu representante ou responsável legal.

  • Permanece o dever mesmo quando o fato seja de conhecimento público e em caso de falecimento da pessoa envolvida.
  • O fato sigiloso deverá ser revelado em situações de ameaça à vida e à dignidade, na defesa própria ou em atividade multiprofissional, quando necessário à prestação da assistência.
  • O profissional de Enfermagem intimado como testemunha deverá comparecer perante a autoridade e, se for o caso, declarar suas razões éticas para manutenção do sigilo profissional.
  • É obrigatória a comunicação externa, para os órgãos de responsabilização criminal, independentemente de autorização, de casos de violência contra: crianças e adolescentes; idosos; e pessoas incapacitadas ou sem condições de firmar consentimento.
  • A comunicação externa para os órgãos de responsabilização criminal em casos de violência doméstica e familiar contra mulher adulta e capaz será devida, independentemente de autorização, em caso de risco à comunidade ou à vítima, a juízo do profissional e com conhecimento prévio da vítima ou do seu responsável.

E sem prejuízo dos processos ético-disciplinares que poderão ser instaurados pelos respectivos Conselhos Profissionais de ofício ou mediante denúncia, os hospitais e profissionais de saúde que desrespeitarem o dever de sigilo poderão ser surpreendidos por ações indenizatórias e por ações criminais, com fundamento no art. 186 do Código Civil e no art. 154 do Código Penal, respectivamente:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Violação do segredo profissional

Art. 154 – Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem:

Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa de um conto a dez contos de réis.   (Vide Lei nº 7.209, de 1984)

Parágrafo único – Somente se procede mediante representação.

Diante de tais circunstâncias, a divulgação de informações sobre pacientes em entrevistas, boletins médicos e notas oficiais, por exemplo, deve ser precedida, sempre que possível, de autorização escrita, firmada pelo próprio paciente ou seu representante legal.

O consentimento confere licitude à divulgação, reduzindo a chances de perda em eventuais processos éticos ou judiciais, mas é importante mencionar que a forma de exposição das informações (redação ou discurso utilizado, por exemplo) também precisa ser analisada.

É que, de acordo com a Resolução CFM nº 1.974/2011, os médicos e estabelecimentos de saúde devem evitar a autopromoção e o sensacionalismo, divulgando as informações de maneira sóbria e impessoal, nos termos do art. 11 da referida norma:

Art. 11 Quando da emissão de documentos médicos, os mesmos devem ser elaborados demodo sóbrio, impessoal e verídico, preservando o segredo médico.

  • 1º Os documentos médicos poderão ser divulgados por intermédio do Conselho Regional de Medicina, quando o médico assim achar conveniente.
  • 2º Os documentos médicos, nos casos de pacientes internados em estabelecimentos desaúde, deverão, sempre, ser assinados pelo médico assistente e subscritos pelo diretor técnicomédico da instituição ou, em sua falta, por seu substituto.

O ideal, portanto, é que antes de divulgar informações sobre pacientes, os hospitais e profissionais consultem as respectivas assessorias jurídicas, para avaliação e mitigação de eventuais riscos envolvidos.