A Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB) tem acompanhado, nesses últimos anos, as discussões em torno da Reforma Tributária e seus impactos para o setor saúde. O resultado desse trabalho foi consolidado em um documento, que visa orientar e informar as instituições sobre as principais mudanças e suas implicações.

Confira a seguir:

Circ.CMB.001.25 – Brasília (DF), 20 de janeiro de 2025

Assunto: Breve análise sobre a Reforma Tributária e os seus impactos para o setor saúde

Iniciada com a Emenda Constitucional nº 132, promulgada pelo Congresso Nacional em dezembro de 2023, a Reforma se materializa com mudanças profundas no sistema tributário nacional, que incluem a centralização da tributação, a simplificação do sistema, trazendo consequentemente uma maior transparência nas transações, objetivando-se, com isso, a redução das desigualdades e a desoneração dos setores com maior vulnerabilidade econômica.

A Emenda trouxe, como foco principal, um novo olhar sobre a tributação sobre o consumo, porém dentre as diversas alterações, ela modificou dispositivos importantes para o terceiro setor na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional, dentre os quais, destacam-se: i) Ampliação da imunidade concedida aos “templos de qualquer culto”, estendendo-se a partir da EC 132 às entidades religiosas e suas organizações sociais e beneficentes.

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (…) VI – instituir impostos sobre: (…) b) entidades religiosas e templos de qualquer culto, inclusive suas organizações assistenciais e beneficentes; (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 132, de 2023)

ii) Não incidência do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD sobre as transmissões realizadas para instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, bem como sobre as transmissões realizadas por elas na consecução dos seus objetivos sociais, observadas as condições que serão tratadas em lei complementar.

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (…) VII – não incidirá sobre as transmissões e as doações para as instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, inclusive as organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos, e por elas realizadas na consecução dos seus objetivos sociais, observadas as condições estabelecidas em lei complementar. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

No que tange a tributação sobre o consumo, a Reforma adota um modelo de tributação já vigente em outros países, baseado em valor agregado, que, na prática, tributa-se apenas o valor adicionado sobre um bem ou serviço, em cada transação, por meio da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), assim como, também modificada a tributação com vistas ao cuidado com a saúde e meio ambiente, onerando bens e serviços que lhes sejam prejudiciais, por meio do Imposto Seletivo (IS).

Neste ínterim, o Imposto Seletivo, que popularmente tornou-se conhecido como ‘imposto do pecado’, tem incidência única, não podendo integrar a sua própria base de cálculo, o que proporcionará uma maior transparência na apuração do seu valor, evitando a incidência do tributo sobre ele mesmo, contado, entretanto, para o cálculo da CBS e do IBS.

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: (…) VIII – produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, nos termos de lei complementar. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023).

Já o Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) assume, de forma progressiva, duas feições:

i) Contribuição sobre bens e Serviços – CBS (art. 195, V da CF), de competência federal, que substituirá o IPI, PIS e CONFINS; e ii) Imposto sobre bens e serviços – IBS (art. 156-A, da CF), de competência estadual e municipal, que substituirá o ICMS e o ISS.

Cumpre destacar, que a principal distinção entre “contribuição” e “imposto” reside no fato deste ser um tributo não vinculados a uma atuação estatal, sendo a sua receita destinadas a enfrentar as despesas gerais dos entes federativos, segundo o critério da necessidade (art. 167, CF). Já a contribuição deve ser destinada à sua vinculação constitucional que, no caso em análise, à seguridade social (art. 195).

Entretanto, apesar de serem espécie tributarias distintas, a EC nº 132/2023, alinhada ao desejo de simplificação do sistema tributário nacional, garantiu a identidade estrutural entre o IBS e a CBS, a fim de que o contribuinte apure a base de cálculo e a alíquota correspondente, seguindo exatamente os mesmos critérios jurídicos, fiscais e contábeis. Assim, temos que:

Art. 149-B. Os tributos previstos nos arts. 156-A e 195, V, observarão as mesmas regras em relação a: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

I – fatos geradores, bases de cálculo, hipóteses de não incidência e sujeitos passivos; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

II – imunidades; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

III – regimes específicos, diferenciados ou favorecidos de tributação; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

IV – regras de não cumulatividade e de creditamento. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

Parágrafo único. Os tributos de que trata o caput observarão as imunidades previstas no art. 150, VI, não se aplicando a ambos os tributos o disposto no art. 195, § 7º. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023)

Ressalta-se, por oportuno, o parágrafo único do artigo 149-B, transcrito acima, pois, há uma relativização do texto constitucional quanto a imunidade aplicada à CBS, pois deverá seguir a regra aplicada aos impostos, ou seja, o previsto no Código Tributário Nacional e não a LC 187/2021, que regulamenta os procedimentos referentes à imunidade de contribuições à seguridade social. Desta forma, uma entidade sem fins lucrativos, desde que cumpridos os requisitos do CTN, poderá gozar da imunidade para a CBS ainda que não detenha o certificado CEBAS.

Importante destacar que Emenda Constitucional nº 132/2023 reservou para Leis Complementares a maior parte de sua regulamentação, com prazos expressos para encaminhamento de propostas pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional, sendo a primeira etapa apresentada em abril de 2024, com a instituição dos tributos acima destacados (CBS, IBS e IS), por meio do PLP 68/24, que culminou na Lei Complementar nº 214/2025, publicada no DOU em 16 de janeiro de 2025

Lei Complementar nº 214/2025

A CMB acompanhou e atuou intensamente no Congresso Nacional a tramitação do PLP 68, a fim de garantir a manutenção da imunidade tributária das instituições filantrópicas, assim como a modificação da proposta originária a respeito da não apropriação dos créditos decorrentes da não cumulatividade do IBS e da CBS, quando o adquirente gozar de imunidade e/ou isenção, permitindo gerar assim a anulação do crédito relativo às operações anteriores.

Obtivemos êxito na permanecia do texto atual do Código Tributário Nacional e, consequentemente, nas regras de imunidade constitucional do setor, contudo, o mesmo não ocorreu quanto a possibilidade de manutenção dos créditos tributários da CBS e do IBS pelas entidades imunes/isentas.

Cumpre destacar, todavia, uma importante vitória nesse processo, relacionada a garantia da alíquota zero dos referidos tributos para dispositivos médicos, itens de acessibilidade para pessoas com deficiência e medicamentos essenciais, que constam dos anexos IV, V e XIV, quando adquiridos por entidades filantrópicas certificadas CEBAS, de acordo com a Lei Complementar nº 187/2021.

Lei Complementar nº 214/2025, foi publicada na edição extra do DOU. em 16 de janeiro de 2025.

Próximos passos

Destaca-se que o segundo projeto de lei complementar, (PLP) 108/2024, que integra do rol de regulamentação da Reforma Tributária já foi apresentado na Câmara dos Deputados, abordando questões sensíveis como a instituição do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços – CG-IBS e as alterações relacionadas ao Imposto sobre Transmissão Causa mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD.

A CMB e suas Federações continuam vigilantes às alterações que estão sendo discutidas no âmbito da extensa e complexa Reforma, a fim de melhor orientar seus associados, reforçando o compromisso do setor na oferta de saúde aos brasileiros.

Mirocles Campos Véras Neto
Presidente da CMB

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Fonte: CMB