Os Cuidados Continuados Integrados representam, em Portugal, uma resposta às mudanças sociais sofridas pelo País. De acordo com a presidente da Associação de Cuidados Continuados e Geriátricos (CURAE) e coordenadora Nacional da Rede de Cuidados Continuados em Portugal (RNCCI), Maria Inês Guerreiro, nos países como Portugal, em que os mecanismos de apoio assentavam nas redes informais de solidariedade, as alterações nos modelos familiares, nas relações de vizinhança, no mercado laboral, e fundamentalmente no papel desempenhado pela mulher, foram introduzidas rupturas nas fontes tradicionais de suporte. “O resultado da análise dos dados disponíveis em Portugal para o âmbito hospitalar revela uma tendência de mudança de perfil na utilização hospitalar nos últimos anos, caracterizada por um aumento da presença da população idosa e de patologia crônica no hospital, o que sugere a necessidade de implementar novas respostas para atender de forma mais específica estes grupos populacionais”. Para adaptar este modelo ao Brasil, deve ser feita uma adaptação às condições locais e a cada região, segundo Maria Inês.

De acordo com ela, a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) propõe um modelo de intervenção integrada (e intersetorial) para o cuidado ao idoso e à pessoa com dependência, fomentando novas orientações no setor da saúde e social. “O desenvolvimento e implementação da RNCCI foram definidos como processos de mudança e modernização organizacional, com repercussões na composição, organização e funcionalidade do atual Serviço Nacional de Saúde (SNS) e Rede de Apoio Social”, explicou. Ela também disse que a Rede contempla propostas estratégicas, organizativas e operacionais no âmbito das políticas de saúde e de desenvolvimento social coerentes com os objetivos de sustentabilidade financeira para ambos os setores.

O modelo da RNCCI oferece a garantia aos cidadãos portugueses de assistência em caso de dependência e coloca Portugal junto aos poucos países europeus que dispõem de um modelo integrado e diversificado em termos de tipologias de respostas de cuidados continuados integrados e cuidados paliativos. “Assim, as respostas integram os componentes saúde e social necessários ao tratamento, reabilitação e manutenção, a par do alívio do sofrimento e promoção do bem estar”, disse.

Em entrevista à CMB, Maria Inês disse que o modelo, para o Brasil, deve ser adaptado ao seu território e população. “A prestação de cuidados continuados é pluridimensional orientada para a promoção da qualidade de vida com ênfase na reabilitação e promoção da autonomia e na participação dos utentes e famílias. A continuidade de cuidados é uma exigência cada vez maior em todos os países. É necessário estudar em profundidade, por região, a prevalência de determinadas patologias crônicas para avaliar a necessidade e pertinência de constituir unidades específicas para atendimento a determinados processos de continuidade de cuidados que se consubstanciem em respostas de cuidados continuados”.

O tema “Cuidados Continuados como alternativa para o Sistema Único de Saúde” será debatido na tarde do dia 24 de setembro, na Sala 1, durante os Congressos das Santas Casas, em Salvador (BA). Maria Inês será acompanhada pelo diretor de Atenção Sociosanitária de Barcelona (Espanha), Antoni Maria Cervera; pelo coordenadortécnico de projetos do Cealag, Paulo Carrara; e pelo provedor da Santa Casa de Mora Alentejo, em Portugal, Manoel Caldas de Almeida.

A Secretaria do evento ainda receberá novas inscrições, no local, a partir do dia 23 de setembro. Mais informações:www.cmb.org.br/congresso.

Confira a íntegra da entrevista:

CMB – O que são os Cuidados Continuados?
Maria Inês Guerreiro – A tendência para o aumento da população idosa em Portugal e na Europa, com o aumento da esperança média de vida, apontam cenários como o aumento da prevalência de doenças crônicas, de evolução prolongada e com elevado grau de incapacidade que, a par com a diminuição da participação das famílias nos cuidados, criam novas necessidades organizacionais e obrigam a um reajustamento da capacidade de resposta dos serviços de saúde e sociais. Por outro lado, nos países como Portugal, em que os mecanismos de apoio assentavam nas redes informais de solidariedade, as alterações nos modelos familiares, nas relações de vizinhança, no mercado laboral, e fundamentalmente no papel desempenhado pela mulher, introduziram rupturas nas fontes tradicionais de suporte. Tudo isto conduziu à necessidade de repensar as respostas de saúde e sociais. A Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) propõe um modelo de intervenção integrada (e intersetorial) para o cuidado ao idoso e à pessoa com dependência, fomentando novas orientações no setor da saúde e social. O desenvolvimento e implementação da RNCCI foram definidos como processos de mudança e modernização organizacional, com repercussões na composição, organização e funcionalidade do atual Serviço Nacional de Saúde (SNS) e Rede de Apoio Social. Contempla propostas estratégicas, organizativas e operacionais no âmbito das políticas de saúde e de desenvolvimento social coerentes com os objetivos de sustentabilidade financeira para ambos os setores.

CMB – Quando eles foram implantados em Portugal?
Maria Inês Guerreiro – A RNCCI foi criada em 2006, com o objetivo de prestar cuidados de saúde e sociais às pessoas idosas e em situação de dependência. É um programa do setor público, desenvolvido pelo Ministério da Saúde (MS) e Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social (MTSS) para cumprir a meta estabelecida no Programa do XVII Governo Constitucional de desenvolvimento de ações dirigidas aos cidadãos idosos e às pessoas em situação de dependência. Teve como objetivo criar “condições que permitam viver com saúde”, assentes “num Modelo Integrado de Cuidados de Saúde às Pessoas Idosas e em Situação de Dependência, que desenvolva a coordenação e a complementaridade entre o setor social, privado e da saúde”, potenciando os recursos existentes.

CMB – Quais os benefícios?
Maria Inês Guerreiro – O modelo da RNCCI oferece a garantia aos cidadãos portugueses de assistência em caso de dependência e coloca Portugal a par dos poucos países europeus que dispõem de um modelo integrado e diversificado em termos de tipologias de respostas de cuidados continuados integrados e cuidados paliativos.
Assim, as respostas integram os componentes saúde e social necessários ao tratamento, reabilitação e manutenção, a par do alívio do sofrimento e promoção do bem estar.

CMB – Quem participa do programa de Cuidados Continuados em Portugal? Apenas as Misericórdias?
Maria Inês Guerreiro – O modelo da RNCCI segue o princípio da proximidade, através do desenvolvimento de uma capilaridade de recursos e da integração de cuidados. Tem uma oferta diversificada em tipologias e entidades prestadoras, quer em internamento, quer no ambulatório. Utiliza um modelo contratual homogêneo para celebração de acordos com prestadores, com objetivos específicos para cada tipologia da RNCCI, o que permitiu o estabelecimento de parcerias com organizações do sector privado, Santas Casas da Misericórdia (SCM), Instituições Privadas de Solidariedade Social (IPSS) e SNS. As Misericórdias são, em Portugal, o maior parceiro da RNCCI.

CMB – É possível para o Brasil implantar o programa?
Maria Inês Guerreiro – O Brasil pode certamente desenvolver cuidados continuados de forma adequada ao seu território e população. A prestação de cuidados continuados é pluridimensional orientada para a promoção da qualidade de vida com ênfase na reabilitação e promoção da autonomia e na participação dos utentes e famílias. A continuidade de cuidados é uma EXIGÊNCIA CADA VEZ MAIOR em todos os países. O resultado da análise dos dados disponíveis em Portugal para o âmbito hospitalar revela uma tendência de mudança de perfil na utilização hospitalar nos últimos anos, caracterizada por um aumento da presença da população idosa e de patologia crônica no hospital, o que sugere a necessidade de implementar novas respostas para atender de forma mais específica estes grupos populacionais. É necessário estudar em profundidade, por região, a prevalência de determinadas patologias crônicas para avaliar a necessidade e pertinência de constituir unidades específicas para atendimento a determinados processos de continuidade de cuidados que se consubstanciem em respostas de cuidados continuados. A destacar a evolução a partir do modelo clássico de cuidado dos doentes baseado no Modelo Biomédico Tradicional, com foco de atenção centrado exclusivamente na alteração biológica e na doença, para um modelo de avaliação e cuidado integral (modelo funcional). A RNCCI estabeleceu estratégias e intervenções adequadas para a constituição de um novo espaço de cuidados que contribui para dar uma resposta coerente e integrada às pessoas que se encontrem em situação de dependência temporária ou prolongada, adaptadas às necessidades do cidadão e centradas no utente, onde este possa aceder aos cuidados necessários, no tempo e locais certos, pelo prestador mais adequado. Dito isto, faz sentido o desenvolvimento de Cuidados Continuados no Brasil, com atenção às suas condições próprias.

CMB – Que mudanças precisam ser feitas?
Maria Inês Guerreiro – É importante uma abordagem na cultura dos cuidados de saúde, tanto em nível dos profissionais, como das populações e das políticas. A saúde tem determinantes sociais que condicionam o nível de bem-estar de toda uma população. Foi necessário em Portugal reconhecer que a saúde e o social devem desenvolver políticas e respostas concertadas e articuladas. Esta é a grande mudança. Como consequência, a Rede de Cuidados Continuados oferece alternativas de apoio à sustentabilidade e otimização do SNS: por oferecer cuidados adequados à população com indicação e perfis de necessidades próprios das tipologias de cuidados da RNCCI, criando uma alternativa à utilização crescente por parte desta população dos cuidados hospitalares a um custo superior ao apresentado pela Rede; por promover a otimização de recursos já instalados e cuja reconversão pode ser proposta através de estudos prévios; tem impacto direto na criação de emprego no país, através da criação de novas necessidades de recursos e perfis profissionais. Pela sua implementação territorial, a RNCCI em Portugal contribuiu assim para criação de emprego em nível local e em todo o continente; proporciona um alto nível de adesão e aceitação dos profissionais e entidades prestadoras ao modelo da RNCCI, bem como um elevado nível de satisfação por parte de utentes, cuidadores e profissionais.

CMB – É possível adotar os Cuidados Continuados sem a participação do Governo?
Maria Inês Guerreiro – Gostaria de assinalar que falo sempre de uma Rede de cuidados continuados integrados e não apenas em respostas de cuidados continuados. Como Rede, esta tem um papel estratégico para a modernização do Serviço de Saúde regional ou nacional e para o seu desenvolvimento sustentado e sustentável.

Fonte: Assessoria de Imprensa CMB