No ano em que o Sistema Único de Saúde (SUS) completa 30 anos, encontrar novas maneiras de financiá-lo, mantendo a universalização do atendimento com uma integração mais inteligente e responsável entre os setores privado e público, à luz das mudanças do perfil epidemiológico do País, é o principal desafio que o próximo presidente do País enfrentará na área da saúde.

Em linhas gerais, foi o que defenderam os três especialistas que participaram ontem da sexta edição do evento A Reconstrução do Brasil, promovido pelo Estado desde o início do ano para debater os caminhos possíveis para o País após as eleições gerais de outubro. Ontem foram discutidas as medidas necessárias para melhorar as condições de saúde e educação.

Ao longo de pouco mais de uma hora, Ana Maria Malik, coordenadora do programa GV Saúde da Fundação Getulio Vargas; Claudio Lottenberg, presidente do United Health Group Brasil; e o professor Gonzalo Vecina Neto, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) apresentaram sugestões sobre quais medidas mais urgentes, mas também viáveis, podem ser adotadas para melhorar o cenário da saúde no Brasil.

Ao abrir a mesa, Vecina Neto afirmou que o próximo presidente precisa ter em mente que o SUS é fundamental. “Um sistema universal de saúde em um País com o tipo de desenvolvimento econômico, social e demográfico que o Brasil tem é insubstituível.

Isso não é uma jabuticaba, é uma cópia das coisas mais civilizadas que foram feitas na Europa. Tem de ter consciência da importância de manter o sistema universal.” Para o médico, é preciso pensar em como o SUS será financiado.

“(O presidente) terá de discutir a questão de financiamento da sociedade. Revisar a questão tributária, fiscal, as renúncias que temos no setor e na sociedade, e definir qual bem-estar a sociedade quer e como vai fazer para financiá-lo.” Essa questão passa por rever os modelos assistenciais. “Eles ainda são voltados para atender doenças infectocontagiosas, mas nossa realidade epidemiológica mudou para doenças crônicodegenerativas”, explica Vecina.

Por outro lado, ele defende a criação de sistemas regionais de atenção à saúde, em vez de municipais, e uma maneira de alcançar isso, diz, é ampliar a estratégia de saúde da família.

Cooperação. Ainda nesse contexto, ele afirma que é preciso melhorar a cooperação com a iniciativa privada. “Hoje as pessoas já pensam em privatização, vira palavrão e acabou a conversa. Ter um melhor relacionamento com iniciativas privadas não é privatizar. Tem de ter controle social, do Estado, e transparência. Mas o que não dá é para ficar na administração direta, porque não tem como.” Lottenberg defende que o debate sobre falta de financiamento seja modificado. “Vamos passar para um patamar mais elevado.

A questão do subfinanciamento é um problema do setor público. No setor privado, o problema não existe, mas há uma prática assistencial ruim, que leva a uma geração permanente de desperdício. “O SUS melhorará quanto mais crescer o privado. É mais recurso que entra na saúde e isso desafoga o SUS.” Defensor da inserção do privado no público, Lottenberg sugere que, para evitar o desperdício, é preciso focar em atenção primária e coordenação do cuidado.

“Existe uma valorização abusiva no mundo da tecnologia, e no fundo as pessoas precisam ser cuidadas, não tratadas.” Para Ana Maria, a distinção entre cuidar e tratar pode ser encaminhada com um incentivo para que se trabalhe cada vez mais em equipes de forma realmente integrada.

“O médico é fundamental, mas não é o único. Quando eu me formei, as profissões de área de reabilitação, como fisioterapia e fonoaudiologia, eram pouco valorizadas. Hoje, (com mais idosos), sem reabilitação não há solução. O médico não é mais o profissional que está acostumado a cuidar. São os outros profissionais de saúde, de reabilitação, enfermagem e psicologia que trabalham com o cuidado.”

Fonte: Interfarma