A Comissão de Direitos Humanos da Câmara realizou audiência pública (9) para discutir as novas medidas para o atendimento da saúde mental no país.

O Ministério da Saúde publicou em fevereiro uma portaria com alterações na legislação vigente. Entre as medidas anunciadas estão investimentos para compra de aparelhos de eletrochoque, internação de crianças em hospitais psiquiátricos, e criação de mais vagas para internações para tratamento de doenças mentais e de abstinência de dependentes químicos.

O presidente do Conselho Federal de Psicologia, Rogério Giannini, vê com apreensão essas novas medidas uma vez que a Lei da Reforma Psiquiátrica de 2001 (Lei 10216/01) trouxe grandes avanços no respeito aos direitos dos pacientes e na sua reintegração social.

Para ele, não é possível fazer alterações profundas como as que estão sendo propostas pelo governo sem que haja uma discussão com a sociedade e com os setores envolvidos.

“As pessoas atingidas têm necessariamente que serem ouvidas, entre outros instrumentos pela audiência pública; pelo controle social; pelo Conselho Nacional de Saúde e pela Conferência Nacional de Saúde.”

A representante do Ministério da Saúde, Dilma Maria Teodoro, concordou que a legislação vigente foi um avanço no tratamento da saúde mental, mas destaca que alguns serviços não estão funcionando de forma correta, o que gerou uma demanda reprimida que está prejudicando os pacientes.

Ela destacou que os investimentos atendem a um pedido das instituições. Segundo Dilma Maria, a política foi discutida no Conselho Nacional de Saúde e nos conselhos estaduais e municipais.

“Inclusive continuamos com o processo de desinstitucionalização para que aqueles que estavam morando no hospital – porque hospital realmente não é lugar para que a gente tenha ninguém morando, concordo plenamente – então que a gente possa oferecer condições de tratamento para eles. Tanto é que nós estamos trabalhando para a ampliação das residências terapêuticas, visando manter a desinstitucionalização. Só que continuamos tendo pessoas com doenças graves que precisam, em crises, de uma internação breve e a gente precisa ter como fazer esse atendimento e fazer um atendimento de qualidade.”

A deputada Erika Kokay, do PT do Distrito Federal, informou que a comissão vai pedir uma audiência no Conselho Nacional de Saúde para que a política seja discutida de forma mais ampla.

“Nós não estamos aqui lutando apenas para que tenhamos mais serviços substitutivos – que é uma necessidade – lutamos para que não tenhamos hospitais psiquiátricos. Não tem que existir hospital psiquiátrico! Porque as crises podem ser atendidas no hospital geral e nós precisamos de Caps 3 que possibilitem inclusive uma outra dimensão de atendimento.”

Kleidson Oliveira Bezerra é usuário dos serviços de saúde mental e defende que o tratamento só funciona se for realizado no Caps, Centro de Atenção Psicossocial porque tem adesão dos pacientes, que se sentem respeitados e acolhidos.

“É uma loucura manter um hospital psiquiátrico funcionando no tempo que a gente está vivendo hoje. Aqui em Brasília mesmo tem um e nos últimos meses faleceu mais de uma pessoa com tratamento, por causa de Odol e eles não tiveram nem competência para cuidar da pessoa, chamaram o Samu para tirar a pessoa do manicômio. A gente, como usuário de saúde mental aqui em Brasília, queremos que fechem o Hospital São Vicente de Paula, construam as residências terapêuticas e tirem o viés religioso do tratamento de saúde mental.”

O representante da Rede Nacional da Luta Antimanicomial, Lúcio Costa, afirmou que a nota técnica do Ministério da Saúde é muito frágil e direciona a política para atender o interesse dos empresários.

Lúcio Costa destacou que existem 103 hospitais psiquiátricos no Brasil. Desse total, 64 por cento são privados e se tornaram ao longo dos anos locais de segregação de pessoas com deficiência, prática de tortura e cárcere privado.

“Porque se o discurso para não financiar Caps é que algumas contas não foram prestadas, qual que é o discurso objetivo para financiar hospitais psiquiátricos que violam direitos? Isso é inaceitável, não há justificativa para isso tanto é que não tem dados para apresentar porque os dados se forem expostos vão sinalizar o rumo da política, que é muito nociva.”

Lúcio Costa lembrou que financiar aparelhos de eletrochoque só beneficia os hospitais que cobram cerca de mil reais por cada sessão, porque para os pacientes não há, até hoje, comprovação científica de que esse tratamento ajude.

Fonte: Agência Senado