A pandemia de Covid-19 trouxe impactos inegáveis para o sistema de saúde. Mesmo com um cenário um pouco mais favorável neste início de segundo semestre de 2021, devido à vacinação contra a doença, os desafios continuam imensos. Não apenas devido ao temor de novas variantes do coronavírus e de novas ondas de casos, mas também em função da quantidade de diagnósticos precoces que deixaram de ser feitos neste período. Tudo isso vai impactar diretamente em toda a cadeia da saúde, seja no atendimento, estrutura e financiamento, seja na qualidade de vida destes pacientes – que podem se tornar casos graves.

Este foi um dos assuntos abordados no “Webinar Saúde Debate – Qualidade de Vida e Pandemia: o impacto de ações e procedimentos de saúde adiados por conta da Covid-19”, promovido nesta quinta-feira (26 de agosto). Este foi o primeiro evento online de uma série que o Saúde Debate vai realizar ainda neste ano, discutindo temas relevantes na área da saúde. 

O diretor de Saúde e Intercâmbio da Unimed Paraná, Faustino Garcia Alferez, destacou durante o webinar a quantidade de procedimentos que deixaram de ser realizados desde o início da pandemia. Na carteira Unimed Paraná, houve uma redução de 22% no número de internações nas comparações entre março de 2019 a fevereiro de 2020 e março de 2020 a fevereiro de 2021. Entre as internações mais afetadas estão as relacionadas a de CIDs de doenças de ouvido e da apófise mastoide (-47,1%); doenças do aparelho respiratório (-45,7%); e sintomas, sinais e achados anormais de exames clínicos e de laboratório (-40%). 

Em relação às cirurgias, no comparativo do mesmo período, a redução média chegou a 24%, com grande impacto para os procedimentos adeno-amigdalectomia (-71%); refluxo gástrico – vídeo (-56%); herniorrafia inguinal (-51%); e herniorrafia umbilical (-51%). Houve ainda queda de 45% nas cirurgias de varizes e 40% nas angioplastias. 

O diretor da Unimed Paraná ainda revelou que os exames preventivos, incluindo PSA, mamografia, colonoscopia, biópsias e citopatológicos, apresentaram uma diminuição média de 17% no período citado, contra 37% no Sistema Único de Saúde (SUS).

O receio de Alferez, assim como de outros especialistas, é de que a falta desses exames preventivos e procedimentos possa fazer com que os pacientes descubram as doenças em estágios mais avançados. “Em algum momento essa ‘conta’ será cobrada mais adiante, especialmente aquelas relacionadas ao câncer. Sou testemunha disso, inclusive. Dois pacientes meus, que antes faziam exames regularmente, não os fizeram recentemente e agora chegaram no consultório com estágio mais avançado de câncer”, relata. 

De acordo com Alferez, o adiamento destes procedimentos não apenas acarretará em maior custo para o sistema de saúde como um todo, com intervenções mais complexas, mas também demandará muito mais da saúde desses pacientes. “Estamos muito preocupados com os exames preventivos. Hoje, estimulamos os beneficiários para que retomem essa rotina, por meio de uma série de diferentes formas de informação e comunicação. Isto pode evitar o agravamento ainda maior da situação, porque a sequela já está aí”, avalia.

O presidente da Federação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos do Paraná (Femipa), Flaviano Feu Ventorim, confirmou durante o Webinar Saúde Debate que os hospitais passaram a receber nas urgências e emergências pacientes crônicos que deixaram de fazer o acompanhamento corretamente durante a pandemia. E eles passaram a “disputar” leitos com os pacientes com Covid-19. Isso sem contar as vítimas de trauma, que também interferem diretamente no atendimento dos hospitais. E, com o aumento da circulação das pessoas, o número desse tipo de paciente também cresceu. “Agora, temos um movimento mais ordenado do que nos momentos de pico de pandemia, mas ainda é um volume grande de pessoas. Até porque os pacientes eletivos estão voltando ou querem começar a voltar”, destaca.

Estrutura para atender a demanda reprimida

Tanto Venturim quanto Alferez lembram que existe uma preocupação sobre como será possível atender a demanda reprimida de procedimentos eletivos que deixaram de ser feitos durante a pandemia. Não será possível absorver ao mesmo tempo tudo o que deixou de ser feito entre 2020 e 2021 e ainda atender os “novos pacientes” deste ano, por exemplo. 

Venturim revela que somente um hospital de Curitiba deixou de fazer, em um ano, 60 mil cirurgias eletivas. De acordo com ele, é necessário verificar a realidade desta retomada. Além disso, este cenário deve impactar diretamente o financiamento dos hospitais. “Temos buscado um equilíbrio para manter as estruturas funcionando. Durante a pandemia, os hospitais receberam equipamentos e as equipes passaram por treinamentos. Temos agora uma certeza: que temos uma melhor estrutura e estamos mais bem preparados. Mas também temos uma dúvida: o financiamento disto tudo”, opina.

Durante o Webinar Saúde Debate, o diretor de Gestão em Saúde da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), Vinícius Filipak, revelou que uma das medidas estudadas neste momento é o desenvolvimento de uma plataforma para reunir todos os dados sobre as demandas de procedimentos eletivos no Paraná. De acordo com ele, isso se faz necessário porque há descentralização de informações e também pela enorme quantidade de procedimentos que deixaram de ser feitos desde o início da pandemia.

Conforme dados da Sesa, houve uma redução de 48% na realização de procedimentos diagnósticos ambulatoriais e consultas entre 2019 e 2020. Quanto às cirurgias eletivas, em 2019, foram feitas 520.093 cirurgias eletivas e 1.924.696 cirurgias de urgência. Esses números caíram para 305.351 procedimentos eletivos e 931.326 de urgência em 2020. Neste ano, entre janeiro e junho, foram realizadas 147.208 cirurgias eletivas e 275.941 de urgência pelo SUS no Paraná.

Filipak ainda cita que os recursos que deixaram de ser empregados nesses casos foram usados no atendimento dos pacientes com Covid-19.

“Se vamos enfrentar um represamento de milhões de procedimentos em um ano, é óbvio que não há capacidade instalada para aumentar em quase 50% um atendimento que o SUS sempre realizou. Essa capacidade instalada não existe e há um limite. Mas o Estado está desenvolvendo um planejamento voltado a recuperar, o mais rapidamente possível, essa demanda. Isso começa pelos diagnósticos das situações clínicas mais graves”, diz. 

O Webinar Saúde Debate – Qualidade de Vida e Pandemia: o impacto de ações e procedimentos de saúde adiados por conta da Covid-19 está disponível na íntegra no canal do Youtube do Saúde Debate. Clique aqui para conferir.

O próximo Webinar Saúde Debate será realizado no mês de outubro com o tema “Cannabis Medicinal – pesquisas, aplicações e riscos de sua utilização na assistência à saúde”. Acompanhe as informações em breve no portal.

Fonte: Saúde Debate