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O desembargador Miguel Kfouri explicou a aplicação de teorias nos processos sobre erro de diagnóstico.

O presidente do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), Miguel Kfouri Neto, abriu o painel sobre Responsabilidade Civil em Obstetrícia, Cirurgia Plástica e Anestesiologia no erro de diagnóstico. O desembargador explicou a aplicação de teorias, como a perda de uma chance para o paciente, em casos de processos envolvendo erro de diagnóstico. “A justiça vem apresentando uma tendência de não deixar dano sem reparação, portanto, mesmo em casos de dúvida quanto à causalidade, há o julgamento a partir da análise da perda de uma chance do paciente devido à ocorrência final”. Ou seja, ao errar o diagnóstico, condena-se pela perda de uma oportunidade e não pelo dano final. Entretanto, a chance analisada precisa ser real, séria e provável.

A afirmação foi feita durante o III Congresso Brasileiro de Direito Médico. O evento, realizado no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR) nos dias 14 e 15 de agosto, reúne cerca de 300 médicos, advogados, magistrados, representantes do Ministério Público e interessados em Medicina, Saúde, Direito e Justiça.

Apesar dessa tendência crescente, Miguel Kfouri Neto recomendou cautela. “O médico não pode trabalhar sob a pressão de ser condenado se não houver resultado favorável. O médico não tem domínio total do paciente, pois cada organismo reage de uma forma ao procedimento. Os tribunais precisam ter essa cautela”. Ainda, ele ressaltou que os tribunais não podem julgar questões científicas em demandas de responsabilidade civil. No final de sua fala, o presidente da Casa ressaltou a importância de um evento com essa temática. “Sentimo-nos honrados em receber esse Congresso tão relevante”, concluiu.

Especialistas – A mesa –redonda também foi composta por representantes das Sociedades de Especialidades de Anestesiologia, Cirurgia Plástica e Ginecologia/Obstetrícia. O 1º secretário da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Dênis Calazans, defendeu que a especialidade não pode ser avaliada no meio jurídico com generalizações. “Obrigação de resultado virou uma tendência do judiciário que precisa ser reavaliado. Não podem pensar na cirurgia plástica como sendo uma coisa única”, disse.

A programação da tarde desta quarta-feira está reservada para debates sobre o sigilo médico e as alterações do Código Penal Brasileiro, hoje tramitando na Câmara dos Deputados. Algumas das propostas da reforma serão objeto de avaliação durante o III Congresso Brasileiro de Direito Médico como: doenças de notificação compulsórias (art. 227); falsificação ou adulteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 231); fornecimento de medicamento em desacordo com receita médica (art. 238). E temas polêmicos que são: exclusão da condição de crime da prática do aborto (art. 128), e ortotanásia (art. 122); bem como a diminuição da pena aplicável à pratica da eutanásia.

Direito Médico: Responsabilidade profissional é destaque do segundo dia do encontro

 

Na manhã do dia 14, o desembargador José Carlos Maldonado de Carvalho palestrou sobre o dano iatrogênico na prática médica durante o III Congresso Brasileiro de Direito Médico, evento do Conselho Federal de Medicina (CFM) que ocorre em Curitiba (PR). Apesar de inúmeras definições do que é iatrogenia, para ele, é todo caso em que há previsão e necessidade do dano. Dessa forma, quando há os dois itens apontados, como em um caso de mastectomia, por exemplo, não há responsabilidade civil. O palestrante apontou que conceitos mais amplos tratam a iatrogenia como todo prejuízo provocado por ato médico em pessoas saudáveis ou doentes.

De acordo com o palestrante, na ótica do Direito a relação médico-paciente é uma relação contratual, escrita o não. Logo, se é um contrato, podem ser aplicados ordenamentos do Código de Defesa do Consumidor, e não somente do Código Civil.

O palestrante explanou sobre a responsabilidade objetiva dos estabelecimentos de saúde, como hospitais e clínicas. “Nesses casos, a relação inicial não é com o médico. Portanto, se há algum dano, o estabelecimento também pode ser responsabilizado, pois ele garante que quem irá realizar o ato está apto para tal ação. É o risco do empreendedor”.

O desembargador comparou o Código de Defesa do Consumidor com o Código Civil, mostrando que além da responsabilidade do fornecedor do serviço de saúde, o Código Civil indicará a reparação do dano, independentemente da culpa. “Temos duas fontes legislativas para esses casos. Elas não se excluem, mas o princípio da norma especial torna-se prioritário sob a norma geral”.

Ainda, o palestrante explicou que a obrigação do médico é de meios e não de resultados. “O médico assume obrigação com o paciente de usar todo o seu conhecimento científico e experiência da prática médica em prol do benefício do paciente. Não se faz presente uma determinação de resultados. Ao prometer resultados, o médico responderá civilmente”.

Além da responsabilidade do estabelecimento de saúde, José Carlos Maldonado de Carvalho também explanou sobre responsabilidade pessoal do médico e da equipe de cirurgia. O cirurgião é responsável pela equipe que contrata, logo, responderá por ela em caso de dano.

No final da explanação, o jurista apontou itens excludentes de responsabilidade civil, como fatos exclusivos da vítima, como não seguir as orientações dadas, interferência de terceiros externos à relação médico-paciente inicial e casos fortuitos e de força maior. Na opinião do desembargador, as escolas médicas deveriam ter uma cadeira de princípios básicos do Direito, em especial para tratar sobre contratos. “Se isso fosse realidade, certamente muitos processos não chegariam aos tribunais”.

Judicalização da saúde

“A jurisprudência encontra uma credibilidade absoluta na prescrição médica”. A afirmação foi feita pelo mestre em Direito da PUC-SP, Clito Fornaciari Júnior. Segundo ele, os juízes brasileiros entendem que “não cumpre ao Judiciário ingressar na avaliação do profissional da Medicina”. A busca de tratamento médico na Justiça foi tema de debate durante o III Congresso Brasileiro de Direito Médico – evento que ocorre nos dias 14 e 15 de agosto, em Curitiba (PR).

Direito à saúde e direitos humanos são debatidos no III Congresso Brasileiro de Direito Médico Segundo ele, a Lei coloca dois requisitos que devem ser observados dentro de uma liminar: “o risco de dano reparado – pela urgência do pedido, onde a doença já justifica esta concessão. E a plausibilidade do Direito, onde os juízes acabam se levando como referencial pela receita médica”.

Para Fornaciari a questão é grave e difícil de ser resolvida. Ele propôs que exista uma possibilidade maios de divulgação dos tratamentos das doenças mais comuns e que se construa uma lista de remédios mais ampla que possa dar segurança à decisão do jurista.

Normas

Quanto à exigência de garantia ao pagamento de atendimento hospitalar de emergência, o procurador de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Diaulas Ribeiro, iniciou sua fala citando o caso do Secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Duvanier Paiva Ferreira. Em janeiro deste ano, o Secretário morreu após percorrer três hospitais e não receber tratamento, seja pela inexistência de convênio das instituições com o plano de saúde do qual era beneficiário, seja por não ter em mãos dinheiro para o pré-pagamento do atendimento em caráter particular.

O ocorrido em Brasília gerou comoção nacional e um intenso debate que culminou na criação do artigo 135-A, que foi acrescido ao Código Penal por meio da Lei Nº 12.653, e que proíbe a cobrança de garantias de pagamento, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar de emergência.

Diaulas criticou a criação do artigo e expôs os diferentes pontos de vista e formas de interpretação e aplicabilidade das Leis, explorando o caso Duvanier para se utilizar de exemplos. Segundo ele, a relação estabelecida não foi de consumo, pois o serviço dos hospitais não chegou a ser utilizado. Além disso, apesar de a polícia fazer uma investigação retrospectiva, com base no atestado de óbito, ele afirma que não se pode avaliar o ocorrido da mesma forma.

Medicina

O palestrante entra no tema do Ato Médico ao afirmar que o conceito de emergência médica não está descrito em nenhuma lei, e que o quadro clinico de um paciente só pode ser diagnosticado por um médico. Sendo assim, o plantonista não pode ser acusado de omissão de socorro uma vez que não teve contato e, consequentemente, não fez um exame clínico do paciente, e explica: “não se pode imputar responsabilidade a quem não fez o diagnóstico. Sem conhecimento não há responsabilização”. Além disso, a pessoa responsável pela recepção da emergência, por não ser da área médica e, desta forma, inapto a fazer uma avaliação, também não poderá ser responsabilizado. “Conclui-se, então, que não há crime”.

Também não pode ser levado em conta como critério para definir emergência o horário em que Duvanier chegou ao hospital, pois dados mostram que apenas 30% dos casos atendimento em PS são realmente uma emergência. Os outros 70% poderiam ser atendidos em consultas eletivas sem nenhum prejuízo ao paciente.

Mudanças

Com relação aos direitos humanos e à morte, a primeira conferência da tarde do dia 14, também do procurador de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Diaulas Ribeiro, tratou sobre ortotanásia e aborto de anencéfalos, destacando as várias mudanças sofridas pelos Códigos de Ética Médica ao longo dos tempos.

O procurador defendeu o direito à morte digna, citando o artigo 15 do Código de Ética Médica, que dispõe sobre consentimento informado, e afirma que sua criação elevou a autonomia do ser humano, que passou a ter o direito de saber detalhes sobre sua condição e tratamentos e, principalmente, optar pela continuidade ou não de tratamento. “O consentimento informado é tão importante, mas tão importante, que Portugal o instituiu como bem penal que só é eficaz quando o paciente tiver sido devidamente orientado das circunstâncias (de sua condição) e consequências (de optar ou não por tratamento)”, explica.

Quando se fala em direitos humanos se fala em saúde, dignidade, respeito à mulher (no caso do aborto de anencéfalos) e à morte. “A ideia de que se tem que morrer sofrendo tomou conta da nossa cultura; ninguém nunca antes nesse país pensou que morrer também é um direito humano”, ponderou o Diaulas, “as pessoas têm o direito de não sofrer no fim da vida e de morrer quando elas bem entenderem”. E encerrou citando um texto de Rubem Alves, que dizia que “a morte é inimiga a ser derrotada” – hoje não é mais assim.

 

Quebra de sigilo é discutida no congresso

A tarde do segundo dia do III Congresso Brasileiro de Direito Médico iniciou com o painel sobre sigilo médico. Os três palestrantes do tema abordaram tópicos relacionados ao direito ao sigilo médico e a violação da informação fornecida ao profissional. O evento ocorre nos dias 14 e 15 de agosto, em Curitiba (PR).

O vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Carlos Vital Tavares Corrêa Lima iniciou as explanações sobre o tema explicando que sigilo profissional vai além das informações confidenciais reveladas ao médico. Abrange a imposição da não divulgação das informações do paciente, mesmo após a morte. O conselheiro afirmou que sigilo profissional é parte do direito à intimidade do cidadão.  “A constituição garante que a privacidade e a intimidade são invioláveis”, afirmou. Ainda, o palestrante citou que o sigilo profissional na Medicina é extensivo ao prontuário e só pode ser revelado com autorização do paciente.

Na sequência do painel temático, palestrou o assessor jurídico do CFM, José Alejandro Bullón. O advogado iniciou sua fala afirmando que sigilo não se resume ao prontuário. “O sigilo é muito mais do que isso. É um direito do cidadão que está em posse do médico”, comentou. O assessor ressaltou que a informação contida dentro do prontuário é uma garantia preservada na Constituição Federal. “O paciente abre livro de sua vida para o médico ciente que suas informações estão resguardadas por força da Constituição”. O palestrante destacou que as resoluções do Conselho que tratam do tema não defendem o direito do médico, mas defendem a sociedade e os direitos do cidadão, resguardados pela Constituição.

O último palestrante do painel, o conselheiro da Ordem dos Advogados de São Paulo (OAB-SP) Roberto Delmanto, tratou dos desafios impostos aos médicos a partir dos conceitos de intimidade e privacidade. A forma como o Código Penal trata profissionais que guardam segredos, como os médicos e crime de desobediência também foram abordados. O palestrante ressaltou que a conduta do médico em não depor, para não quebrar o sigilo profissional, não configura crime de desobediência. Ainda, foram apresentados casos em que o Estado violou o sigilo através de busca e apreensão em estabelecimentos de saúde. Por fim, o conselheiro finalizou afirmando que “a intimidade, protegida pela privacidade, é um valor ainda essencial à vida em sociedade”.

 

Fonte: CRM e CFM