gotasCriticado pelas entidades de classe desde que anunciou o lançamento do Programa Mais Médicos, o Ministério da Saúde não consegue usar com eficiência o dinheiro disponível no Orçamento para construir hospitais e comprar equipamentos — justamente a área com os serviços mais deficitários para os brasileiros, segundo pesquisas. Os sindicalistas questionam a vinda de profissionais estrangeiros ao país e dizem que o Estado não oferece estrutura necessária para o exercício da profissão. O governo alega que oferta, sim, condições aos médicos, mas a quantidade deles é insuficiente para atender a demanda em alguns locais do país, como no Norte e no Nordeste e nas regiões periféricas das grandes cidades.

Dados do Siga Brasil, sistema de acompanhamento das contas públicas da União, mostram que é grande a dificuldade do Ministério da Saúde — e de outras pastas — em tirar do papel os projetos previstos. Este ano, por exemplo, o órgão desembolsou apenas R$ 1,9 bilhão em execução de obras de hospitais e em compra de equipamentos, de um montante autorizado no Orçamento de R$ 10 bilhões. A quantia aplicada não representa sequer 30% do total estimado para ser usado até dezembro deste ano.

Para a estruturação, a construção e a ampliação de unidades de atenção especializada e básicas de saúde, por exemplo, a pasta previa desembolsar R$ 4,4 bilhões. Porém, até agora, só R$ 88 milhões foram efetivamente repassados — 2% do total. As Unidades de Pronto Atendimento (Upas), uma das promessas de campanha da presidente Dilma Rousseff, também não escapam da baixa execução orçamentária. O ministério estimou investir R$ 431,6 milhões com a construção e ampliação de 125 Upas este ano. No entanto, até agosto, nenhum centavo saiu dos cofres da pasta para bancar a programação.
O fato é que o Ministério da Saúde deixou de investir, desde 2010, exatos R$ 22,4 bilhões em obras e equipamentos, que incluem desde ações de saneamento básico em comunidades rurais até a compra de insumos para prevenção e controle de doenças. “A falta de investimentos é péssima e demonstra a falta de política no setor. Isso vem ocorrendo há muitos anos. Na época de eleições, vemos o tema em evidência, mas não há políticas de longo prazo, independente do partido que esteja no poder”, avalia o professor associado da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília Carlos Augusto Cruz. Segundo ele, enquanto a população aumentou, o número de leitos continuou o mesmo. “Não investir resulta na falta de cuidados básicos da saúde. Por isso, temos hospitais superlotados e sucateados”, acredita.

Baixo investimento

O secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castelo Branco, especializada na análise do orçamento, avalia que, se a preocupação do governo é melhorar a área de saúde, lançando o Programa Mais Médicos, o setor deveria estar liderando os investimentos públicos. “Constata-se uma execução medíocre há várias anos, o que deixa a Saúde atrás de vários ministérios que, supostamente, não mereceriam tanta atenção. Se há falta de equipamentos médicos aqui em Brasília, que dirá no interior do país”, afirma. Um levantamento realizado pela ONG mostra que, entre 2003 e 2012, em valores atualizados, a pasta deixou de investir R$ 34,2 bilhões.

Outras pastas da área social seguem o mesmo caminho longe do ideal de investimentos. O Ministério da Educação (MEC), responsável por aplicar recursos em instituições federais de ensino, deixou de aplicar, nos últimos quatro anos, quase R$ 22 bilhões na melhoria da educação brasileira. O mesmo ocorreu com o Ministério da Justiça, a quem compete investir em instituições de segurança. Mais de R$ 5 bilhões deixaram de beneficiar o sistema desde 2010. No período, a pasta nunca conseguiu gastar mais de 50% dos recursos previstos para investimentos, que incluem obras de construção e manutenção em presídios e compra de equipamentos para a Polícia Federal, por exemplo.

Aposta federal

O Programa Mais Médicos, lançado pelo governo federal em 8 de julho, está em fase de recepção e acolhimento dos profissionais. Ao todo, 1.096 médicos brasileiros e 282 médicos estrangeiros foram distribuídos em 519 municípios e 16 distritos sanitários especiais indígenas.

Fonte: Correio