A população brasileira está envelhecendo rapidamente e atingiu um dos maiores índices de envelhecimento do mundo. De acordo com o recente censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 2000 e 2023, a proporção de idosos no Brasil quase duplicou. Em 2070, os idosos deverão representar cerca de 38% da população, passando dos atuais 33 milhões, em 2023, para 75,3 milhões. Com isso, a idade média dos brasileiros, que em 2023 era de 34,8 anos, passará a ser de 51,2 anos. A tendência é o Brasil ter cada vez menos jovens e cada vez mais idosos. Esse cenário apresenta um desafio urgente: como o sistema público de saúde, já sobrecarregado, lidará com uma população cada vez mais envelhecida?
Sabemos que, à medida que envelhecemos, a necessidade de cuidados de saúde se intensifica. Ter e manter um plano de saúde privado ou pagar por consultas e exames particulares torna-se cada vez mais inviável para muitos. Como resultado, um número crescente de brasileiros dependerá exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS), que hoje já é responsável por 75% da população. Esse cenário de envelhecimento não só sobrecarrega o sistema de saúde público, como também exige uma infraestrutura que esteja preparada para atender a essa demanda crescente. Nesse contexto, o papel dos dispositivos e tecnologias médicas torna-se fundamental, pois desempenham um papel essencial na prevenção, diagnóstico e tratamento de diversas condições associadas ao envelhecimento, como doenças crônicas e degenerativas.
O fato é que o sistema público não avançou com a rapidez necessária para acompanhar o envelhecimento da população. O SUS precisará se preparar para um aumento significativo na demanda por tratamentos específicos para os idosos, que não apenas exigem mais consultas e exames, mas também procedimentos de reabilitação, cuidados paliativos, entre outros serviços de saúde especializados. Isso inclui uma política industrial focada nos fabricantes de dispositivos médicos que terão que desenvolver produtos e equipamentos mais acessíveis e adaptados para melhor atender os idosos nos hospitais, como camas e macas de altura ajustável, cadeiras de rodas ergonomicamente desenhadas, tecnologias de monitoramento remoto e sistemas de suporte à mobilidade, além de tecnologias de monitoramento e diagnóstico. Se o sistema de saúde público e as empresas de dispositivos médicos não acompanharem essa mudança, os custos poderão disparar, e a qualidade do atendimento pode ser comprometida.
Este cenário exigirá um investimento ainda maior do poder público e do setor privado em inovação tecnológica no setor de dispositivos médicos, políticas públicas eficazes para incentivar o desenvolvimento de soluções adaptadas à nova realidade demográfica. Esse mesmo setor, que desempenhou um papel crucial durante a pandemia de COVID-19, fornecendo equipamentos como ventiladores pulmonares, luvas, seringas e tecnologias essenciais para o diagnóstico, tratamento e monitoramento de pacientes.
Oportunamente, o país está discutindo uma reforma tributária, ação fundamental para o fortalecimento do setor, principalmente eliminando as distorções existentes atualmente, quando um ente público ou sem fins lucrativos importar diretamente qualquer equipamento não paga tributos, e se comprar este mesmo equipamento fabricado no país, paga em média 35%.
Sem dúvidas é necessário criar políticas de incentivo à inovação, promover parcerias público-privadas, e desenvolver programas de financiamento que favoreçam a produção nacional de tecnologias de saúde que sejam tanto eficientes quanto acessíveis.
Outro ponto que merece atenção é a urgente atualização da tabela SUS, que está desatualizada há décadas. Essa defasagem interfere diretamente na capacidade de atendimento, na compra de dispositivos médicos necessários, e prolonga o tempo de espera dos pacientes para cirurgias e procedimentos eletivos, que são essenciais. À medida que a tabela não reflete os preços de mercado, as filas de espera do SUS continuam a crescer. Uma atualização que acompanhe os custos reais dos insumos e serviços de saúde é vital para que o sistema continue operando de maneira eficiente.
Construir um sistema de saúde público sustentável e resiliente passa necessariamente pelo desenvolvimento de uma indústria de dispositivos médicos inovadora e capaz de atender às demandas da população brasileira que segue em rápido envelhecimento. O fortalecimento do SUS, aliado a parcerias estratégicas com o setor privado, é essencial para garantir que ele possa atender os idosos de maneira eficaz e eficiente.
*Paulo Henrique Fraccaro é CEO da ABIMO – Associação Brasileira da Indústria de Dispositivos Médicos.
Fonte: Saúde Business