O câncer é considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) a segunda principal causa de morte em todo o planeta. Segundo estimativas do Observatório Global do Câncer (Globocan), em 2020, 4 milhões de pessoas foram diagnosticadas, sendo que 1,4 milhão delas morreram. Por meio de iniciativas do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS), do Ministério da Saúde, o setor público brasileiro já conta com o que há de mais moderno para prevenir novos casos e garantir atendimento ainda mais preciso e personalizado a cada paciente.
Os projetos Mapa Genoma Brasil e Onco-Genomas, conduzidos respectivamente pelos hospitais BP — A Beneficência Portuguesa de São Paulo e Moinhos de Vento (RS), coletam dados genômicos e clínicos de pacientes de oncologia atendidos no SUS em todo o país para embasar a implementação de estratégias de gestão populacional em câncer de mama, câncer colorretal e câncer de próstata, trazendo informações ainda não conhecidas sobre a população, impactando diretamente o atendimento oferecido atualmente no sistema de saúde pública.
Os estudos colaboram com a construção do banco de dados genético do Governo Federal, chamado de Genomas Brasil, e vão ao encontro das prioridades de saúde definidas pelo novo governo, que reconhece o potencial a longo prazo de iniciativas como estas, alinhadas à medicina de precisão, para a redução dos custos de investigação e aumento das taxas de diagnóstico, tratamento e prevenção, melhorando o acesso aos serviços de saúde e à informação, além de contribuir com a redução da morbimortalidade causada por essas doenças.
O Mapa Genoma Brasil, por exemplo, teve início em 2021 com o mapeamento e registro do perfil clínico, epidemiológico, familiar e genômico de 156 pacientes com câncer de mama, 82 de câncer colorretal e 35 de câncer de próstata, localizados em oito centros de saúde de todas as regiões além da BP. Através das variantes identificadas, será avaliada a suscetibilidade a essas doenças, garantindo atendimento personalizado aos participantes. A população do estudo será composta por homens ou mulheres com idade igual ou superior a 18 anos, não aparentados entre si, com diagnóstico atual de câncer de mama, próstata ou colorretal. Na população brasileira, o câncer de mama e colorretal são os dois mais frequentes em mulheres, enquanto o câncer de próstata e colorretal são os mais frequentes em homens. Os familiares dos casos-índice deverão ser de primeiro ou segundo graus (pais, irmãos, avós e tios) de ambos os sexos com idade igual ou superior a 18 anos. Após a construção e análise do heredograma, dois familiares serão convocados para a coleta de sangue.
Já o Onco-Genomas, também iniciado em 2021, testa uma linha de cuidado oncológico baseada na inclusão do sequenciamento completo do exoma — exame genético que permite a identificação de mutações em partes específicas do DNA humano, comumente utilizado para o rastreamento de doenças genéticas. A análise está sendo realizada tanto no sangue (perfil hereditário) quanto nas células dos tumores (perfil somático). Até o final de 2023, serão recrutados 350 mulheres e 250 homens diagnosticados com câncer de mama e próstata de diferentes regiões brasileiras. No eixo do câncer de mama, estão sendo incluídas mulheres com idade superior a 18 anos, estádio clínico II ou III e com tumores superexpressando HER-2. Já no eixo do câncer de próstata, os pacientes devem apresentar diagnóstico de adenocarcinoma de próstata em estádio IV, ou seja, metastático.
Embora o Brasil seja um país de dimensões continentais e características que variam conforme cada região, seus pesquisadores ainda se baseiam em bancos de dados da população americana ou europeia quando se trabalha com sequenciamento genético. Estudos como os do PROADI-SUS geram cada vez mais conhecimento sobre o desenvolvimento das patologias e seu comportamento na população, contribuindo para o desenvolvimento de terapias cada vez mais eficazes, assim como em estratégias de prevenção. Além disso, trazem informações inéditas da população local, impactando diretamente no atendimento dos pacientes no SUS, de forma cada vez mais personalizada e eficiente tanto do ponto de vista de novos tratamentos, quanto do de prevenções individualizadas para casos de risco.
Somando as iniciativas, há cerca de 40 centros oncológicos participantes, sendo que a expectativa é encerrá-las até o final deste ano. Com isto finalizado, será factível verificar a presença de alterações genéticas que possam explicar padrões de incidência distintos da doença, bem como resposta ao tratamento. Quanto mais pessoas participarem, mais contribuições teremos para que as próximas gerações não voltem a ter as mesmas dificuldades no enfrentamento dessas patologias.
*Gustavo Guimarães é médico coordenador técnico do Mapa Genoma Brasil na BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo; Daniela Dornelles Rosa é médica oncologista e responsável técnica do Onco-Genomas Brasil, do Hospital Moinhos de Vento, representantes do PROADI-SUS.
Fonte: Saúde Debate